terça-feira, 24 de outubro de 2017

Minha cidade de Patos e seus 114 anos

Depois de muitos anos ausente passei o feriadão de 7 de setembro deste ano em Patos, minha cidade natal, conhecida carinhosamente como a “Morada do Sol”. Fui para o casamento de um sobrinho querido, Leonard Trigueiro com Luanna Lima. Como o casamento foi no dia 9 à noite aproveitei o meu tempo na cidade para reencontrar familiares e amigos, visitar lugares que fizeram parte da minha infância, da minha adolescência e, porque não dizer, até mesmo da minha maturidade às vésperas de completar 70 anos.
Pois é, nasci em Patos no dia 8 de novembro de 1947 a cidade tinha apenas 44 anos e agora no dia 24 de outubro de 2017 chega aos seus 114 anos.
Atualmente a Morada do Sol é um importante polo socioeconômico do sertão paraibano, localizada a cerca de 300 quilômetros de João Pessoa, a capital do estado da Paraíba, com mais de 100 mil habitantes. Portando, Patos já não é a mesma cidade onde passei importante parte da minha vida, evidentemente não poderia ser a mesma cidade dos anos 50, 60 e 70 do século passado onde vivi intensamente. Patos é atualmente uma cidade do século XXI em pleno desenvolvimento no sertão nordestino.
O feriadão de 7 de setembro, realmente foi um reencontro com a minha cidade que já não conhecia tanto assim e, flanando pelas ruas do centro e da periferia aos poucos fui redescobrindo os lugares que frequentei por muitos anos. Escolas, igrejas, casas, bares, restaurantes, clubes, cinemas, sinucas, o antigo cabaré da beira da linha do trem, o Tiro de Guerra e tantos outros lugares por onde passei e vivi por muitos anos. Mas alguns lugares marcaram muito a minha vida na cidade entre eles o Colégio Diocesano, que depois passou a ser o Colégio Estadual, onde aprendi muito do que sei até hoje, o imponente Colégio Cristo Rei, o Cine Eldorado, Patos Tênis Clube, o lugar que sediou o Fortelândia e o território onde foi a casa em que nasci na Rua Pedro Firmino 110.
Não pode deixar de visitar também a Catedral de Nossa Senhora da Guia, a Cruz da Menina e a Igreja de Nossa Senhora da Conceição, fechando, assim, o ciclo de reconhecimento dos lugares sagrados e profanos da minha querida cidade de Patos. Alguns desses lugares já não existem ou porque foram demolidos ou reformados para outras atividades, mas tudo isso faz parte das mudanças desejadas na cidade que cresce ordenada ou desordenadamente, que transforma os seus bens culturais materiais e imateriais e, com o passar do tempo vão construindo, andaime por andaime, uma outra identidade onde se mesclam o antigo e o novo nos diferentes espaços e tempos urbanos da pequena cidade, levando-a à terceira mais  importante  cidade do estado da Paraíba.
Patos cresceu e continua crescendo estendendo-se para as áreas rurais com as construções de grandes condomínios e outras edificações como se estivesse emergindo do chão seco do sertão uma outra cidade no entorno da antiga “Morada do Sol”. É uma cidade que cresce com vocação de   centro sociocultural importante no semiárido nordestino, favorecido pela sua posição geográfica que polariza atividades de negócios, de serviços de saúde, de educação, de cultura e tantas outras para atender vários   municípios paraibanos e dos vizinhos estados de Pernambuco, Rio Grande do Norte e Ceará.
Patos, é um núcleo rurbano atraente, aqui uso o neologismo de Gilberto Freyre para definir uma sociedade em transição do rural para o urbano, estrategicamente localizada num centro polo de uma região.  Ou seja, um núcleo de convergência de vários interesses ao mesmo tempo conectado ao mundo globalizado pelas mídias e redes sociais digitais, as redes cotidianas mediadas pela tradição oral do seu povo, dos poetas populares, dos cantadores, do artesanato e da feira no mercado público. E mesmo sendo um polo de desenvolvimento da região preserva importantes manifestações tradicionais da cultura nordestina, a sua culinária, o jeito hospitaleiro do patoense receber, a luta contra as adversidades do tempo, suas festas religiosas e profanas. Patos é assim, sempre presente na minha história de vida e na minha memória.
Parabéns Morada do Sol pelos seus 114. 

quinta-feira, 5 de outubro de 2017

As Festas aos Reis Negros no Seridó Nordestino

Três importantes festas à Nossa Senhora do Rosário, padroeira dos negros no Brasil, são realizadas há mais de cem anos no mês de outubro, em Pombal e Santa Luzia na Paraíba e em Caicó no Rio Grande do Norte. As três cidades, localizadas no Sertão nordestino, na Microrregião do Seridó paraibano (Pombal/Santa Luzia) e norteriograndese (Caicó), foram importantes núcleos urbanos no período da expansão da agricultura e pecuária na região.
Concentração na comunidade Pitombeira
Os negros foram levados como mão-de-obra para as fazendas ribeirinhas do Semiárido para trabalharem na criação de gado e principalmente no plantio do algodão, o ouro branco do Vale do Seridó, assim denominado pela sua qualidade e boa aceitação no mercado externo. Portanto, segundo Roberto Benjamin no livro a Festa do Rosário de Pombal:


A presença negra no sertão deveu-se ao Ciclo do Algodão. Introduzido na periferia da zona canavieira, nas terras menos úmidas, o algodão, no século passado, com a revolução industrial e a Guerra Civil americana, tornar-se-ia um produto nobre de exportação no Brasil. Pouco a pouco a lavoura algodoeira foi penetrando e acabou por fixar-se em terras do sertão. (BENJAMIN, 1976)

Festa do Rosário de Santa Luzia/PB, 2007
Cavalgada rumo à Santa Luzia
Com a presença do negro nessas localidades vieram também a devoção a Nossa Senhora do Rosário e suas manifestações culturais tradicionais que continuam presentes nas mais diferentes atividades socioculturais, econômicas, religiosas e profanas. As festas à Nossa Senhora do Rosário são um marco importante da religiosidade e da cultura popular tradicional nas comunidades negras do Seridó nordestino onde foi significativa a agricultura do algodão, que teve grande importância na economia da região. 
Em Pombal a festa do Rosário é realizada na primeira semana de outubro.
Cavalgada
Em Santa Luzia sempre acontece na segunda semana e em Caicó na última semana do mesmo mês. Como quase todas as festas de padroeiros e padroeiras as de Nossa Senhora do Rosário, nestas localidades, têm o seu novenário, as missas, procissões, hasteamento das bandeiras, quermesses, parques de diversões, bailes populares, mas se destacam pelas ricas manifestações folclóricas.
O que as diferencia das demais festas é o cortejo real dos grupos de danças caraterísticos dessas festas dos reis negros. O cortejo quase sempre é constituído por juiz da irmandade do Rosário, reis, rainhas, vassalos, grupos dos pontões, pelas bandas de cabaçais e os grupos dos congos.
Cavalgada chega à cidade Santa Luzia
Durante um longo período, sempre acompanhado pelo professor e pesquisador Roberto Benjamin, realizamos pesquisas etnográficas nas três localidades e registramos diferentes momentos dessas festas observando as singularidades de cada uma delas.
A festa do Rosário em Pombal é diferente da festa em Santa Luzia que também diferente da de Caicó. Portanto, quero aqui destacar o cortejo do Tope do Juiz, um dos momentos mais significativos da festa do Rosário em Santa Luzia o que a torna diferente das outras duas.


O Tope do Juiz na Festa do Rosário em Santa Luzia


Juiz da Irmandade do Rosário
A cidade de Santa Luzia fica às margens da BR-230 a uma distância de aproximadamente 270 quilômetros de João Pessoa, a capital do Estado da Paraíba, e cerca de 40 quilômetros de Patos, um importante polo econômico do Sertão paraibano. A cidade de Santa Luzia tem fácil acesso por automóvel e várias alternativas de ônibus, tem um hotel de porte médio com acomodações simples, mas aconchegantes. 
Pontões recebem a Corte Real
É uma boa opção para quem desejar conhecer uma da mais tradicionais festas de Nossa Senhora do Rosário aqui na Paraíba e que acontece neste final de semana.
Portanto, conforme a tradição local, nos próximos dias 7 e 8 a Festa de Nossa Senhora do Rosário em Santa Luzia chega ao seu ponto mais significativo com a saída do Juiz da Irmandade do Rosário, em cortejo pelas principais ruas em direção à igreja matriz da cidade.

Pontões abrem passagem para o Cortejo Real

O Tope do Juiz, assim denominado pela tradição popular, tem início com uma concentração, logo nas primeiras horas da manhã do sábado, na comunidade de Pitombeira uma reminiscência de um quilombo localizado no município de Várzea, que fica a uma distância de 15 quilômetros de Santa Luzia. O juiz sai em cortejo da comunidade de Pitombeira acompanhado por um grande número de vaqueiros até a entrada da cidade de Santa Luzia onde se encontra com o cortejo real, o grupo dos pontões, a banda de cabaçal, as autoridades públicas, civis, eclesiásticas e o povo em geral. 
 Cortejo com a Banda Cabaçal

Depois de receber a benção e as saudações das demais autoridades o cortejo segue pelas principais ruas da cidade até a igreja matriz de Santa Luzia. Durante grande parte do dia o cortejo sempre acompanhado pelos cavaleiros, banda de pífanos, os grupos de danças e o povo percorrem diversas ruas visitando as casas que oferecem comidas e bebidas à comitiva real. E assim é o Tope do Juiz na Festa de Nossa Senhora do Rosário em Santa Luzia, uma tradição de 142 anos. 



Cortejo Real

Cortejo Real

Cortejo Real